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22 de maio de 2010

Papel em branco

   Após cinco anos de inatividade o jornalista abre novamente seu notebook. Não sabia ao certo sobre o que escrever, então resolve ler as notícias a procura de um assunto interessante.
   No início de sua carreira tinha sido um profissional competente, de opiniões fortes e posições irredutíveis, mas a realidade das redações fez com que desanimasse. Logo passou a escrever quase que por encomenda, pois era necessário atender à demanda de textos, que muitas vezes não correspondiam em nada às suas ideias. E pouco antes de se aposentar só conseguia pensar na vida tranquila e despreocupada que levaria. Mas o tempo passou, e a vida pacata que desejava tornou-se insuportável, por isso pretendia agora voltar à ativa.
   Havia muitos assuntos sobre os quais discorrer, mas o problema maior era o que escrever sobre eles, pois chegava agora à conclusão que nada tinha a dizer a qualquer pessoa. Tinha passado tanto tempo apático, sem opinião ou reação ao que acontecia à sua volta que agora o simples ato de se posicionar em relação a algo parecia-lhe extremamente difícil.
   De repente veio a terrível descoberta: ele nunca teve algo a dizer. O velho jornalista passou boa parte de sua vida profissional a divulgar ideias alheias, a repercutir opiniões de terceiros, e com isso sua própria identidade havia ficado comprometida.
   O jornalista olhou uma última vez as notícias, reproduzidas na íntegra de outros sites, opiniões desprendidas de seus autores originais. Ele fechou o notebook e pegou uma caneta e um bloco de papel. Ainda não sabia sobre o que escrever, mas sabia como escrever. Já é um começo.

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